24 de dez. de 2012

Ex-Boxeador


o ex-boxeador

sentado ao meu lado

reclama da coceira

do nariz recém-operado

e mostra a cartilagem

que tirou da barriga e orelha

pra reconstruir a cara

penso nos ossinhos espalhados

depois de encarar

ringues e camas de hospitais

agora

tudo que ele quer

é pousar são e salvo

na sua terra natal

pra poder conversar na sua língua estranha

e coçar o nariz em paz

30 de nov. de 2012

Endless Hope


até hoje
recebo spam
daquele bar
onde você me
levou uma vez

dá vontade de deletar
mas deixo lá

até hoje
achava que te levando
pro quebra-mar
faria você
se apaixonar

garoto caiçara
bermuda
à vontade
sem jeito com
a garota do interior

não sei se foi eu
ou se foi você
que demorou mais pra reparar
que não dava
pra reparar
mais nada

27 de nov. de 2012

As conchas


hoje na praia
catei cinco conchinhas
duas com a sua cara
e eu eternizei

as outras
eu joguei no chão
pisei
e quebrei

10 de nov. de 2012

Três vidas e cinco continues


às vezes
a gente tenta
de tudo

todas as
passagens
secretas

todos as
dicas das
revistas

e mesmo assim não tem jeito

então
a gente busca

novas aventuras
novos acessórios
novos códigos

mas uma pena
que não posso levar
todas as vidas
que acumulei

e todos
os pontos
de experiência

pros novos desafios
que me esperam
além da luzinha vermelha

7 de nov. de 2012

Metade da minha alma é feita de maresia


Mar, metade da minha alma é feita de maresia
Pois é pela mesma inquietação e nostalgia,
Que há no vasto clamor da maré cheia,
 Que nunca nenhum bem me satisfez.
 E é porque as tuas ondas desfeitas pela areia
 Mais fortes se levantam outra vez,
 Que após cada queda caminho para a vida,
Por uma nova ilusão entontecida. 
E se vou dizendo aos astros o meu mal
É porque também tu revoltado e teatral
Fazes soar a tua dor pelas alturas.
 E se antes de tudo odeio e fujo
 O que é impuro, profano e sujo,
É só porque as tuas ondas são puras.

poema de Sophia de Mello Breyner Anderson. dica do Coletivo Action


16 de out. de 2012

Administração Democrática Popular


se os prédios diminuissem
talvez lembrasse mais claramente
dos passeios no carro
com colantes do capistrano

e o vovô
que pagou a minha passagem pro cobrador
(e me salvou)

se fosse barcelona ou califórnia
talvez lembrasse do bottom da telma
que te deu motivo
pra falar comigo

15 de out. de 2012

Horário de verão


pra passar esse fim-de-semana com você
vou em qualquer direção
cruzo a balsa
o ferry boat
atravesso a ponte pênsil
sem sono

e se todos esses anos de capital
te deixaram sem biquini
não faz mal
passa na c&a do atlântico
que tem os baratos
e floridos

mas só se tiver sol

20 de set. de 2012

Esperando chegar o momento de te encontrar


espero
ansioso
pela próxima foto
a próxima atualização
o próximo compartilhamento
no qual
alguém vai te marcar
o filtro
do instagram
que vai dar
mais realce aos traços
do sorriso
dos olhos
ou do nariz
é certo
que há algo novo pra admirar
mesmo a trezentos mil
quilômetros de distância

18 de set. de 2012

Ruínas do Abarebebê


para Raphael Morone

partindo por cidades
de um litoral escondido
o trenzinho para pedro de toledo
vai devagar
saiu cedo

olhando da janela
via tesouros enterrados
sob folhas de palmeiras
e um índio
sentado

peruíbe, itanhaém, mongaguá
ilha bela, ilha comprida, iguape
uma aventura qualquer
num dia de sol
no vale do ribeira

15 de set. de 2012

Casa de Tia Maria da Barra


Casal emoldurado,
flâmula do Santos Futebol Clube,
santo com cordeiro aos ombros,
rádio de válvulas,
irradiando estática...
Que nada,
é chiado de marimbondo
construindo toca
na parede de pau-a-pique.

poema de Domingos Santos, em Peixe-Palavra (poesias caiçaras) (Edições Caiçaras, 2012)

30 de ago. de 2012

Online, 3 da manhã


ontem escutei
todas as playlists que você
fez upload na internet
descobri que
os últimos discos que você
está escutando
são os mesmos que
os meus
e quantas estrelas que você
deu pro filme
que eu achei tão ruim
mas o melhor foi ver
a foto de perfil
em tamanho grande
os olhos tão claros
o cabelo sobre a blusa
azul e branca
e tudo isso
sem saber
seu facebook

13 de ago. de 2012

Barcelona 92


será que você lembra
da adrenalina
dos primeiros dias

da flecha incendiada
do verão espanhol
do barquinho de papel

sabia que se
não fosse para sempre
ia perder

e quem fazia mais pontos
eram os travestis
as calçadas de gaudi
seu amor por picasso

aprendia
com destreza
sobre as barreiras
mas não estava nem aí

se pra mim o melhor era
quem apertava mais rápido
a mais b
às vezes c

7 de ago. de 2012

110 bpm


desculpe
interromper
seu sono
mas a música
era tão boa
que precisava
fazer você
escutar

24 de jul. de 2012

Oratório


são tantos beijos e abraços
conversas e prosas
e a hospitalidade de quem traz a melhor cachaça guardada

são morros e acidentes
imagens e oratórios
e cidades com nomes do que tinha de mais rico pra oferecer

guardo numa redominha de vidro
as unhas vermelhas
que arranquei
de seus dedos

e as tardes ensolaradas
como essa última
antes do ônibus
partir

7 de jul. de 2012

A caixa de discos do Alê


a caixa de discos do alê
deve estar cheia de discos
que nunca mostrei pra você
deve estar cheia de livros
e vídeos
dos seus artistas favoritos
deve estar cheia de dicas
pra não fumar
deve ter uma foto do dia
que ele conheceu os seus pais
e da emoção no seu rosto
ao apresentá-lo à família
deve ter algumas passagens
ou souvenir antigo
das viagens que fizeram
e que ficaram pra trás
pois agora o trabalho
toma todo o tempo
deve ter a velinha do aniversário
de 7 anos da filha de vocês
quem sabe também tem
a coletânea que eu te fiz
e que ele vai jogar fora
pra sua filha de 7 anos
não achar
na caixa empoeirada
e ver que tem a assinatura do pai
que eu nunca fui

3 de jul. de 2012

A cidade


tantos dias na cidade
tantas noites na cidade
não sei por que ainda me perco
numa ida ao bar
ou a procurar um lugar
procurar um alguém
pra subir comigo
nos mais altos
e velhos edifícios
tão difícil quanto
procurar um abrigo
é verdade que não há ninguém
é verdade que não há o que fazer
em madrugadas perdidas
quando os carros correm
e cortam os viadutos
e me levam
muito mais rápido
do que eu iria
a pé
queria saber como anda a cidade
como anda você
se a cidade morreu
depois que eu a deixei
queria saber
se a cidade sou eu


imagem: Gregório Gruber (reprodução)

2 de jul. de 2012

Convite para exposição


Para quem estiver por Santos nesta terça-feira (3), segue um convite.



Exposição fotográfica retrata artistas contemporâneos de Santos

Originalmente realizado em 2008, o trabalho fotográfico “Retratos Biográficos da Arte de Santos” volta a ser exibido em Santos, no mês de julho, com fotos inéditas de artistas santistas dos mais variados gêneros. O trabalho é de autoria dos fotojornalistas Bruna Indalécio e Ciro Hamen e ganhou destaque por evidenciar a cultura da Cidade.

A exposição mostra artistas em suas casa, locais de trabalho ou junto a suas obras e tem como proposta mostrar algumas das caras mais importantes da cultura contemporânea de Santos. Entre os retratados estão os compositores Gilberto Mendes e José Simonian, os escritores Flávio Viegas Amoreira e Marcelo Ariel, e os artistas plásticos Mário Gruber e Luiz Hamen.

Em um ano de pesquisa, foram fotografados artistas dos mais diversos estilos e que, de alguma forma, têm vínculo com Santos – nasceram, vivem ou deixaram a sua marca aqui.

Por meio das fotografias, os jornalistas fazem um panorama da cultura na cidade de Santos,
mostrando artistas de várias gerações. É um registro histórico, jornalístico e artístico à sua maneira.

“Retratos Biográficos da Arte de Santos” estará em exposição a partir do dia 3 de julho no Millor Cyber Café, localizado na Av. Marechal Deodoro, 7, Gonzaga, em Santos. A abertura do evento será a partir das 20 horas e contará com a presença de alguns dos artistas retratados.

Retratos Biográficos da Arte de Santos
Local: Millor Cyber Café (Av. Marechal Deodoro, 7, Gonzaga, em Santos)
Data: a partir do dia 3 de julho, abertura oficial às 20 horas

27 de jun. de 2012

Roadrunner (sua versão)


para Jonathan Richman (obrigado por três ou quatro minutos de pura diversão)

queria poder
tocar de novo
roadrunner
pra você
um ou dois
acordes
no seu
violão
três ou
quatro
minutos
de pura
diversão

queria poder
ouvir de novo
roadrunner
na sua mão
dedos tortos
muito rápido
um minuto
trinta
segundos
e no seu rosto
um sincero
sorriso -
radio on

20 de jun. de 2012

Atlas


os canais
me levam
ao caminho
contrário
do teu
me levam
ao mar
sem querer

longe
da sua nova
ou velha
casa que
eu nem
conheci

levando
nas costas
o fardo
de apagar
noites
em que
sozinha
enfrentou
escuridão
cordilheiras
e precipícios
para encontrar
não
um verme
e sim
um príncipe

15 de jun. de 2012

Desaforismos

Selecionei alguns trechos interessantes do livro Desaforismos, do amigo Flávio Viegas Amoreira, lançado recentemente pelo selo Edições Caiçaras. Uma coletânea de pensamentos que - em muitos casos - compartilho com Flávio.


O que difere os homens é "qual a melhor ilusão para se viver". uns tem a droga, outros as religiões, alguns se apegam ao sacrossanto casamento e vidinha familiar, alguns (os raros!) elevam ao real a mais nobre delas: a ARTE!

...

Temo muito quando uma mamãe paulistana ou carioca faz enxoval para o baby na Flórida. Vem aí um monstro comportamental!

...

O Capitalismo é um nazismo em conta gotas

...

Toda palavra a mais do que um sentimento real é um desaforo ao amor

...

Muitas pessoas não sossegam enquanto não mudam o ser amado. E, quando conseguem, percebem que ele perdeu a graça.

...

Quando ainda espero ansioso sei que amo e nisso que aguardo num arrasto encantado chamo o durável do Amor.

DESAFORISMOS, Edições Caiçaras (2012)

10 de jun. de 2012

Rodoviárias e aeroportos


Sou do mar
mas minhas despedidas nunca são no porto
são sempre em rodoviárias
ou em aeroportos

9 de jun. de 2012

Se isso não valesse a pena


Eu não queria brigar com você
Eu não queria estragar o show do LCD
Eu não queria ir embora de táxi
Eu não queria que eu fosse e você ficasse

Eu não queria que você fosse tão dura
Eu não queria que tudo fosse minha culpa
Eu não queria ser esquecido
quando você estiver com os seus amigos

Quero achar alguém que me convença
De que você e eu não dure
Quero achar alguém que me convença
De que isso não é o amor verdadeiro

Eu não queria ficar mal a vida inteira
Sexta, sábado até segunda-feira
E você sabe que eu não tentaria vê-la
Se isso não valesse a pena

30 de mai. de 2012

Beleza perdida de Porto Alegre


para Simone

imagino com que cuidado
pinta as tuas unhas
nas manhãs frias
do sul

como que pede
o corte de cabelo
na altura do ombro
e paga feliz
ao ver
no espelho
o melhor resultado

corre
pra lotérica
pois precisa
abrir o caixa

uma lágrima escorre
ao pensar que
posso nunca
mais te ver

e ficar apenas na lembrança
aquele sorriso
o jeito sem graça
e os dedos finos
me passando o dinheiro
por trás do vidro

22 de mai. de 2012

A menina de orelha suja


primeira manhã
de frio entrando
pelas frestas da porta
de um quarto improvisado

manhã de agosto
você envia uma mensagem
por celular cheia de abreviação
(me arrependi de ter ido embora hoje)

na bagunça da escrivaninha improvisada
credencial com seu nome
de sobrenome italiano
e nome de estado americano

o perfume do cabelo
no travesseiro
e marca dos pés
que quase saiam pra fora do colchão
o que sobrou da
primeira noite
de segredo
(acordei agora, você já foi?)

tudo isso pra depois fingir
ser alguém que não sou
tentar de toda maneira prender
alguém que não posso prender
alguém que não podia prender
o maior desperdício da história

e já estava quase 100%
nos caminhos e atalhos
com você
por exemplo
chegar perto da orelha
nem pensar
tudo por culpa do pai e da menina de orelha suja
e claro
a violência dos cotonetes

16 de mai. de 2012

Somewhere


fim de semana
conheceu lugar tão lindo
com teus amigos

quero te levar lá,
você disse
tudo bem, eu quero

hoje
nem lembro o nome
ou o que tinha de tão lindo

mas sei que
se um dia pisar lá
vou reconhecer pelo que tu falou

vou saber
que foi ali
que um dia me imaginou

8 de mai. de 2012

Lanchinho da madrugada


busco
na reconstituição dos fatos
em poemas
de quando
você ainda era minha
o sabor
mais gostoso
de lanchonete qualquer
aberta
só pra não precisar
encher a geladeira
com nada
(não que você ligasse)
nunca deixava
a salada de frutas estragar
e o café gelado
cuidados
que devia ter
desde que vi
o seu nome
no filtro de barro
na casa
do meu avô

2 de mai. de 2012

Mochilão


pega o ônibus em uma terça-feira chuvosa
pega o carro em uma quarta-feira de sol
pega a carona que nessa eu não vou mais
pra minas gerais

tenho certeza que
ele te leva pros melhores lugares
e com ele faz os mais lindo roteiros

todos aqueles que eu não pude fazer
por puro medo de perder você
no meio de alguma montanha
ou em uma estrada de cerração
intensa

e quem sabe
em uma dessas viagens
num posto de gasolina
no norte
do chile
não esbarro em vocês
pedindo
informações

17 de abr. de 2012

Arcada dentária

mais uma manhã
sem beijo
de bom dia
enquanto
não escova
os dentes

a princípio
eu não entendia
e ela vira
pro lado
direito o seu
preferido

tudo
pra não perder
o encanto
da língua
e dentes
limpos

era linda
mania
de manter
a manhã
sem mau hálito

imagino
se na pia
ainda tem
separada
a minha
escova de dentes

1 de abr. de 2012

Lagoa da saudade

a mancha de açaí
na calça
que nem a chuva
conseguiu tirar
está aí
como prova
de tarde alegre
e ensolarada

o número de execuções
de sugarcube
no itunes
não deixa negar
quantas vezes ouvi
isso contigo
em noites frias
em cobertas quentes

o cartaz do filme
na locadora
traz aquele ator
tão bravo cowboy no cinema
em lindo pôr do sol
enquanto a gente
sentava
na primeira fileira

28 de mar. de 2012

The only place




We were born with sun in our teeth and in our hair
When we get bored we like to sit around, sit around and stare
At the mountains, at the birds, at the ocean, at the trees
We have fun, we have fun, we have fun when we please

We wake up with the sun in our eyes
It's no surprise that we get so much done
But we always, yes we always, we always have fun
Yes we always, yes we always, we always have fun

Why would you live anywhere else?
Why would you live anywhere else?
We've got the ocean, got the babes
Got the sun, we've got the waves
This is the only place for me

So leave your cold behind
We're gonna make it to the beach on time
Yeah leave the cold behind
We're gonna make it to the beach on time

Why would you live anywhere else?
Why would you live anywhere else?
We've got the ocean, got the babes
Got the sun, we've got the waves
This is the only place
This is the only place
This is the only place
This is the only place for me

BEST COAST - "The only place"

22 de mar. de 2012

No silêncio da noite

nasci quando ela me beijou
morri quando me deixou
e vivi algumas semanas enquanto me amou


do filme No Silêncio da Noite (1950), de Nicholas Ray

17 de mar. de 2012

Dezesseis

aos seis
no pré
do municipal
ela pediu um beijo
enquanto eu distribuia
as folhas
que a professora
pediu
eu não disse nada
eu nunca mais disse nada
nem quando nos encontramos
mais tarde
na terceira série
e eu queria
tanto
quanto ela

aos dezesseis
no intercâmbio
cultural
ela esqueceu
na minha mesa
os papéis
meio sem jeito
devolvi
em troca recebi
um bilhete que dizia
venha almoçar comigo e minhas amigas
passei o ano
evitando
cruzar seu caminho
e não falar
inglês

27 de fev. de 2012

Caixa de mensagem

lembra
quando você
ligava
pedindo pra
eu
subir a
serra

agora
você nem
atende
mais os
meus
tele
fonemas

24 de fev. de 2012

O auge da felicidade

"Como eu quero me preocupar agora
de novo economizar, combinar um dia pra te visitar
não ter tempo nem dinheiro de sobra
e ter tudo." 


Grenoble/FR, umnavio


tempo errado
em que te conheci
tempo chato
pra mim

passa um mês,
dois, três
e depois
ligar pra você

pra te contar
dos meus
dias que
nunca foram tão bons
como esses
dias

nunca vi
tantos lugares bonitos
tantos navios passando
tantas pinturas
em janelas

nunca me senti tão preparado
pra compartilhar
minha felicidade
com alguém
por isso
te liguei

saudade
você tem
dos fins de semana
de frente
pro mar

mas as viagens
que não fizemos
agora você faz
só não precisa
fazer questão
de me contar

preciso me contentar
em
compartilhar
minha felicidade
com os outros

pois não quero
mais ser
preso

prefiro ser como aquele cara
que vi
dentro do mar

só com a mãozinha
pra fora
segurando o tênis
e camiseta

16 de fev. de 2012

As jabuticabas

não conheço
a tua cidade

só conheço
os teus gostos

os teus medos
o teu sotaque

não conheço
as suas ruas

que agora
são outras

me ensina
como é

nascer
longe do mar

conheço muito
e tão pouco

eu só sei
que lá
também tem
baratas

14 de fev. de 2012

Três de Janeiro

olho do outro lado da mesa
e não vejo você
sempre ali a me olhar
três de janeiro. três dias se foram e ainda nem vi você

hoje a noite será devagar
o ano passou tão rápido
eu já voltei pra são paulo e não para de chover

eu checo o e-mail, checo o celular
mas nunca nada de você

a ausência é cruel
seus cotovelos apoiados na mesa
seus dedos passando por papéis
não aguento mais. quero te ver

não é justo
você ter minha camiseta
e eu não ter uma peça de roupa sequer

nem vestido, nem calcinha
pra eu apertar no meu nariz e ter um pouco de você

enquanto tu toma sol em outra praia
longe do mar de santos onde se entregou a mim
eu espero na chuva o retorno daquela
que pra sempre quero chamar de: minha mulher

São Paulo, 3 de janeiro de 2011

1 de fev. de 2012

Não ponho os pés numa prancha de surf há quinze anos

Os meus amigos no continente acham que só porque vivo no Havaí, estou no paraíso.
Como férias permanentes.
Que só bebemos "maitais", a balançar os quadris e a pegar ondas.
Estão loucos?
Pensam que estamos imunes à vida?
Como podem pensar que as nossas famílias são menos prejudicadas?
Os nossos cânceres menos fatais.
Os nossos sofrimentos menos dolorosos.
Não ponho os pés numa prancha de surf há quinze anos.

George Clooney no filme Os Descendentes.



24 de jan. de 2012

Sorocaba/SP

o táxi
é nave
espacial

pra um lugar
com pouco espaço
pra dançar

onde há ETs
e não cometas

onda há
um rapaz
de xadrez

que espera
a sua
carona

me leva
pra coxinha
do real

pro boliche
do kana

pro sorvete
pro parque

pro amanhecer
de um dia
de trabalho

matar a fome
no supermercado
de tarde

matar a sede
antes de ir
com gatorade

só que
em um lugar
menos roots

17 de jan. de 2012

Santos/SP

Chama pra sair, mas pelo estado que eu estou 
Melhor deixar para amanhã
Ah não! Amanhã já tem jogo do peixe
Só assim pra não ter tempo pra pensar na gente
Já que não há mais "a gente"

trecho da letra de Santos/SP, da banda umnavio


12 de jan. de 2012

Caricatura de um passeio

Numa das voltas do destino
Subimos o Morro do José Menino
A natureza em ribanceira
E nós na via estradeira
Vinha em viés a ventania
O parapente não saía
Satisfazendo nosso desejo
Uma moqueca de abadejo
Que linda vista da baía
Num sábado de sol
Em tua companhia

poema da amiga Jô Rodrigues, que nos deixou essa semana. Publicado em Santos Revisitada, da Estação Catadora (2011), projeto do qual também tive o orgulho de participar.

9 de jan. de 2012

Mathilda negra

esperta

encosta
a bicicleta
na porta

não fala
com nenhum
estranho

natalie portman
negra
aos doze

entra
na loja
e pega
o detergente
o troco
o tchau

para quem leva
para o pai louco
seria lindo

se fosse
para leon
o profissional

5 de jan. de 2012

Blusa branca (suja de areia)

a bola rola

ela corre pra buscar

deixa pra mim
nem digo nada

ela vê que vou chutar

não há nada mais lindo
que ela e essa blusa
branca de frente pro mar
preto
na praia
agora

suja de areia

ela pode alcançar
mas deixa pra mim

devolvo
ganho um sorriso
mesmo com as feridas no pé
andando feito
cavalo manco

3 de jan. de 2012

Nova Zelândia

um sorriso quase perdido
em e-mails e fotos antigas
em imagens à luz do dia
em uma dança do ventre

arrisca uma noite qualquer
a arte de seduzir
no seu cabelo bem preto
naquele vinil colorido

um telefone perdido
e-mail, por sorte, um reply
só pra saber onde você está
na volta de sorocaba
ou na volta do mar

as histórias de você presa
em uma chuva de verão
você falou pra ela
que queria trocar de lugar

um chamado na madrugada
só pra saber se você
ainda vê filmes
e não voltou
pra oceania

1 de jan. de 2012

Noturno da Baixada

foto: Ciro Hamen
De noite a terra
baixa ainda mais
e entre as dunas
deixa ver
um negro transatlântico
traficando
de porto em porto
seu parco contrabando:
vozes, ferramentas
e um óleo pesado e grosso
que empapa o solo
entope os canais
o sono.
Triste cidade litorânea!
meus olhos mal te distinguem
do mar da terra da lama.

poema de Alberto Martins, em Cais